sexta-feira, julho 18, 2008

les yeux bandés

obedecendo... pela primeira vez depois de tanto tempo, ela se pôs a caminhar sem que a luz penetrasse sua retina. Não obedecia inocentemente a um comando, satisfazia vigorosamente a um instinto, a um desejo que sabia que se realizara desde o momento em que lhe cobriu os olhos com uma fina camada de tecido cujo aroma fazia com que tudo parecesse conspirar para que seu característico perfil não atrapalhasse o momento, ela, uma montanha russa de emoções, ele não poderia prever sua reação, era tudo abrigado num rosto meigo, e voz doce quase infantil. Descobria ali seu fetiche pela insegurança e pelo inesperado e entre tantos pensamentos confusos ainda lhe escapava uma análise dos gestos dele. O modo como a conduzia pela mão e de como deixara a casa incendiando de fragrâncias diversas, pensadas uma a uma, sabia que ela reconheceria cada uma delas, ela, que sempre se preocupara com os detalhes se entregava ainda com receio à perfeição do momento.
Ele que tantas vezes se entregou com intenso prazer a todos os seus caprichos, sabia dos perigos de surpreendê-la, mas sabia também que satisfazê-la daquela forma era o que levaria ao extremo deleite.
Entre os sons inebriantes, uma música cujo ritmo acompanhava o desejo de ser possuída e o medo de gostar daquela subordinação, e o som incinerante da respiração dele. Cortou essa nuvem sonora com um breve pedido “por favor preciso que você sinta antes de tudo!” e ela inexplicavelmente aceitou.
Enquanto ele a despia ela percebeu como a falta de um sentido aguçava todos os outros, ele tinha gestos calmos e sedutores que contrastavam com seus ansiosos pensamentos. Os pés descalçados, a alças baixas, o vestido que parecia acariciar o corpo demoradamente enquanto caia, os seios que antes apertavam o tecido aderente a eles, agora libertos. Sua calcinha úmida de desejo, peça do desejo dele, e que ao mesmo tempo o encobria, tirou delicadamente. Não via, mas ela sabia de seu sorriso ao cheirar profundamente a doce peça tirada.

quinta-feira, julho 17, 2008

intenções gostosinhas

noite cor de ameixa
abraços que liquefazem
músicas que aliciam
anseios dissimulados
boca que incinera a nuca
vontades manifestas
sorriso ledo
despedida tão longa
...quanto meus fios translúcidos

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

sem nada a dizer (a muito tempo)

"Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar, nem pra rir
Socorro, alguma alma, mesmo que penada
Me entregue suas penas
Já não sinto amor, nem dor, já não sinto nada
Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate, nem apanha
Por favor, uma emoção pequena
Qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Em tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Socorro, alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento, acostamento, encruzilhada
Socorro, eu já não sinto nada, nada"